Filho de António Correia Quelhas
Felisbela da Conceição Palheiros
Natural de Lamares; lugar de Justes.
Data de nascimento 12|07|1919
Data do óbito: 11|05!1992
Lavrador, explorador de volframite e mestre de obras de construção civil.
Divide a sua vida entre Justes, Vila Real e Luanda.
Com grande experiência na construção civil e na iprodução industrial de vigas de pré-esforçado, assumiu o desafio de projectar a igreja "nova" de Justes em 1961.
Membro da Comissão Fabriqueira da Capela de Sta Maria Madalena e da Direcção da Associação de Bombeiros Voluntários de Justes.
Honesto, justo, solidário e altruista são caracteristicas que definem o seu perfil de cidadão.
(centenário do seu nascimento)
PLACA DE HOMENAGEM NO SEU CENTENÁRIO, AFIXADA NA FACHADA PRINCIPAL DA IGREJA DE SANTA MARIA MADALENA.
DISCURSO
Homenagem a Jacinto Quelhas
Estamos
aqui hoje para homenagear, Jacinto Alves de Almeida Quelhas. Esta homenagem
pontua o seu centenário.
Nasceu
a 12 de Julho de 1919.
O
nosso pai Jacinto, Quelhas para os amigos, teve origem humilde mas de
excelência e foi educado dentro dos valores do humanismo.
Passou rapidamente da infância para o estado de adulto precoce, já que ficou sem pai aos doze anos de idade, tendo que assumir-se quase como chefe de família, inicialmente orientado pela sua mãe Felisbela Palheiros, impedindo-o de continuar a estudar como estaria nos planos da família.
Passou rapidamente da infância para o estado de adulto precoce, já que ficou sem pai aos doze anos de idade, tendo que assumir-se quase como chefe de família, inicialmente orientado pela sua mãe Felisbela Palheiros, impedindo-o de continuar a estudar como estaria nos planos da família.
Foi um homem bonito por dentro e por
fora, em novo e em velho, fazendo parte da geração que viveu os
constrangimentos da 2ª Guerra Mundial e nunca esqueceu as suas origens humildes,
que esperam por boas colheitas e investem o suor e as lágrimas para adubar as
terras.
Foi lavrador, mineiro, pedreiro, mestre-de-obras e
empresário fabril. Teve alguns sucessos na vida e alguns insucessos como toda a
gente, seguindo sempre os seus princípios e valores.
No após guerra teve a coragem de
deixar a mulher e duas filhas para procurar nova forma de vida para sustentar a
família. Migrou para uma província ultramarina, Angola, mais concretamente para
a cidade de Luanda. Permaneceu lá de forma descontínuada até Junho de
1974.
A responsabilidade, a honestidade, a
solidariedade e a lucidez foram as suas facetas mais acentuadas adquiridas ao
longo da vida, com conhecimentos resultantes de uma postura quase auto-didacta,
amiga do saber, informando-se através da leitura, e esta foi a grande herança
que nos deixou – o seu exemplo de vida. Sempre considerou o seu ponto de
partida, as suas origens aqui nesta aldeia de Justes, onde quase todos
trabalhavam no campo produzindo aquilo que consumiam, extraindo da natureza o
seu magro sustento.
Nunca expôs a sua família aos
perigos da guerra colonial e conhecendo de forma realista o que se vivia nesse
território, o seu sonho angolano foi sempre um sonho condicionado, pois era um
individuo consciente dos dramas sociais, das suas origens e da sua identidade.
Foi católico, nem sempre praticante,
no significado vulgar que se dá a esta denominação. Não praticava todos os
rituais da Igreja, visto que estes foram criados pelos homens e não por Deus.
Cumpria os dez mandamentos da lei de Deus e respeitava sobretudo o seu
semelhante. Cumpria, não por temer Deus, mas por ser essa a sua condição de
Homem, tolerante e bem formado. Era um cidadão, solidário, sempre disponível
para ajudar, respeitar e compreender o outro, um homem activo, que fazia
acontecer sem esperar pelos outros, tinha sentido crítico sobre o que se
passava à sua volta, e era um homem discreto, qualidades que fizeram dele sem
dúvida um cristão, católico de baptismo e de ensinamentos. Falhava ao ritual da
missa e da comunhão, mas nunca falhou ao ritual da despedida, como supremo
dever de acompanhar os mortos à última morada.
Foi certamente um pecador como todos
nós, um ser imperfeito mas com muitas qualidades. Foi um “construtor” em
permanência, sempre tinha algo para fazer, um projecto em curso, que animava
cada um dos seus dias. Foi um entusiasta das máquinas e das tecnologias que
amaciavam a vida dos homens e das mulheres, reduzindo o trabalho braçal dos
camponeses e dos operários.
Ele conhecia bem a vida rude e
difícil dos transmontanos.
Quando eu disse que foi um lavrador,
não foi por acaso. Ele não foi um agricultor, ele foi um lavrador de arado a
rasgar a terra.
Nunca recusava a ajuda a ninguém,
por vezes até a pessoas que não a mereceram. Cuidou sempre da sua mãe, dos seus
irmãos, das suas filhas e até aceitou sem hesitações, ser tutor de duas meninas
órfãs, quando um drama da vida lhes tocou à porta.
Teve só uma única companheira, toda
a sua vida, a nossa mãe, que estimou, cuidou e amou sempre. Adorava os seus
quatro netos e sempre que eu referia que um deles era tão giro quando bébé,
dizia-me sempre: “Nos nossos filhos e netos, todas as idades são bonitas. “
Fez muitas obras na sua vida
profissional.
Quando eu tinha 4 ou 5 anos, vi pela
primeira vez um projecto de arquitectura que era esta igreja e percebi muito
espantada, numa atitude muito curiosa e de pequena aprendente, as voltas que
aquilo dava para se fazer esse trabalho. Tinha que subir a uma cadeira para ver
os desenhos onde estava proibida de tocar. As horas gastas até ao apuramento
final foram muitas. A nossa mesa da sala estava sempre cheia de papelada,
réguas e esquadros, e o meu pai e as minhas irmãs, especialmente a mais velha,
ajudava-o no rigor do desenho.
Tudo foi desenhado consoante a sua
imaginação, considerando algumas indicações de outras pessoas, atendendo às
igrejas que já tinha visto noutras paragens, e à sua experiência na arte de bem
construir. Tudo foi projectado com a sua orientação. E este grande arco ogival
que não é de fácil execução, é a evidência da qualidade do seu trabalho.
Poderei dizer que esta igreja nasceu
na nossa casa. Evidentemente, que muitas foram as pessoas que contribuíram para
a concretização deste projecto colectivo de uma comunidade inteira, mas de
facto esta igreja nasceu pelas suas mãos e pelo depuramento assertivo dos seus
conhecimentos e imaginação. Já teve reparações, obras de beneficiação, o
interior já foi de mármore, agora é de madeira e futuramente terá outro
revestimento qualquer, segundo o gosto das futuras gerações, mas a matriz
manter-se-á por séculos.
Ao fazer 100 anos sobre o seu
nascimento, achei justo e oportuno, que isso ficasse registado para memória
futura desta comunidade, através de uma placa, em que as novas tecnologias nos
permitirão consultar toda a informação disponível, e nos permitirão actualizar
sempre com novos dados e informações a esse respeito e que enriquecerão a nossa
identidade e o nosso património.
Em meu nome e das minhas duas irmãs
Lina e Maria Ermelinda, agradecemos ao Senhor Padre Amílcar e à Junta de
Freguesia por acederem a este nosso pedido e estendo este agradecimento às
pessoas que aqui estão presentes e que o conheceram.
Dois meses antes de nos deixar, numa
das muitas conversas que tivemos perguntei-lhe se tinha medo de morrer. A
resposta foi rápida e frontal. NÃO, sem pensar muito ou manifestar alguma
dúvida.
Quantos poderão responder assim?
Esta resposta é a prova que estava
bem consigo mesmo e com os outros, vivendo um equilíbrio perfeito também e
supostamente com Deus.
Partiu muito cedo, sem aviso prévio,
muito de acordo com a sua personalidade, já há 27 anos, deixando-nos, nós
filhas, eternamente órfãs, porém considero que ninguém morre enquanto viver no
nosso coração e enquanto alguém o recordar.
Grata pela vossa atenção.
Anabela
Quelhas (filha).
NOTÍCIAS DE VILA REAL